quinta-feira, outubro 30, 2008

post nº 077

AS MELHORES COISAS DA VIDA

Inventar uma música
Compor um poema
Lucidez na força
Que quebra a algema

Andar nu e livre
Transportando balões
Insuflados do timbre
Das minhas canções

Sentir numa areia
O salitre da praia
Onde cheguei à boleia

Espinho da micaia
O amor é uma ideia
Em tons de cambraia

Jorge Coimbra

domingo, outubro 19, 2008


post nº 076

POEMA DO HOMEM SÓ

Negro nascer do sol
De um dia qualquer
De um princípio qualquer

Escuro, era o dia
Só, era o homem
Seu sonho: a mulher

Seu pensar era nu
Era vago e cru
Felicidade de nada saber

Porém, desgraçado,
O sol escondeu-se em luz cega
E nisto que foi, um ser que chega
Falou de possuir com facilidade
E o homem sorriu da sua vaidade
E disse: eu creio, eu creio

Nisto, nota a costela desaparecida
E rompeu em soluços
Alguém lha retirara
Quando prostrado era de bruços

O ser diferente
Apareceu num repente
Com a tal maçã Bíblica
E ao homem a ofereceu
Que sôfrego a mordeu
Com força triplica

E o ser satisfeito
Cinicamente imperfeito
Disse ao homem:
Homem, sou Lúcifer
Essa maçã era tua mulher

Neste Paraíso, submisso,
Encobriu-se o homem
Destapou-se a mulher
Não culpemos Deus por isso

Jorge Coimbra

terça-feira, outubro 14, 2008

post nº 075

EPITÁFIO

Em gravação tumular,
quero que fique inscrito
que, de clamores e gritos,
memórias não quero levar

Antes abandono a saudade
(que ninguem chore por mim)
morre com a mesma idade
dela me solto por fim

Já do corpo me despeço:
até sempre companheiro!
sai tu de mim primeiro.

Tenho a vida que mereço
entre quebra e recomeço
acabo rindo primeiro.

Jorge Coimbra

sexta-feira, outubro 10, 2008

post nº 074

A PRIMEIRA VEZ

Pegadas que deixei na areia
Ondas da minha praia
Em noite de lua cheia
Curvaturas duma saia

Descalço, despido de tudo
Abraço a lua naquele altar
beijo-lhes os lábios, o olhar mudo
E beijo-lhe as mãos sem falar

Foi uma noite penitente
até que a maré me acorda cedo
molha-me os pés, cheio de medo
Volto para casa mais inocente

Será que foi só providência
A concebida iniciação
que me roubou o coração
que me tirou a carência?

Ainda hoje na minha rua
Já sem areia nem praia
Já sem curvaturas de saia

Espumas do meu coração
Relembram-me a iniciação
Mais inocente da lua

Jorge Coimbra

domingo, outubro 05, 2008

post nº 073

DEIXEI FUGIR

Deixei fugir o Setembro
Fugindo nas asas do vento
Lembrem-me (que já não me lembro)
Se de Verão era tempo

Busquei um fugaz descanso
Fechei os olhos pensativo
Fiz o recuo e o avanço
De quem sabe que está vivo

Acordo como dum sonho
Vai-te, pesadelo profundo!
Pegadas onde as não ponho

Risos que já não tenho
Beijos que já não sinto
Abraços dum vagabundo

Agora já nem sou membro
De poetas ou poemas
Deixei fugir o Setembro

Acordem-me lá mais p'ra Dezembro

Jorge Coimbra